Literatura no Fasc 2025: Elisama Santos, Mafuane Oliveira e Cristiane Sobral abrem a programação com debates sobre antirracismo e aquilombamento
A literatura abre portas e cria novos mundos, mas uma de suas potências mais bonitas é reunir e acolher leitores. Em constante crescimento, o Salão de Literatura Manoel Ferreira foi prova disso e fez jus ao tema da 40ª edição do Festival de Artes de São Cristóvão (Fasc), “Na cultura a gente se encontra”. Com grande participação do público, o espaço brilhou ao colocar em evidência temas fundamentais, como o antirracismo e o aquilombamento no primeiro dia de evento, inaugurado no Dia da Consciência Negra (20 de novembro).
Em alusão à data, a programação do salão de literatura teve exclusividade preta, celebrando a contribuição afro-brasileira para os pilares culturais de São Cristóvão e do Brasil. Na primeira mesa, mediada por Geneluça Cruz Santana e iniciada às 14h, as autoras Elisama Santos e Mafuane Oliveira abraçaram como temática a importância da literatura na promoção de uma educação antirracista e não violenta, fabulando sobre a materialização de novos mundos possíveis.
Elisama é nacionalmente reconhecida por seu trabalho como escritora, apresentadora e psicanalista. Baiana radicada em São Paulo, é autora de nove livros, entre eles “Educação Não Violenta” e “Por que Gritamos?”, e os romances Mesmo Rio e Ensaios de Despedida, em que retrata a força das vozes femininas e negras em narrativas sobre maternidade e a relação hereditária entre mulheres. Para ela, colocar a população negra no foco é revolucionário, é ir além da sobrevivência e da resistência para alcançar uma existência plena, em que tem espaço para falar sobre a saúde das relações, dos limites e sobre como cuidar deles.
“Cada coisa que eu escrevo tem a intenção de mexer na forma como a gente pensa e enxerga o mundo. Os personagens são sempre caminhos e criar narrativas que vão além da dor é algo que me nutre e que alimenta a minha esperança de que vamos criar referências mais bonitas do que as que nós tivemos”, destacou.
Já Mafuane, pesquisadora, artista e consultora, é coautora de Doma: Saberes Negros e Enfrentamento ao Racismo e assina obras infantis como Cinderela do Rio e Mesma Nova História, finalista do Prêmio Jabuti 2022, além de apresentar o programa Contos Rá-Tim-Bum, dedicado ao poder das narrativas.
“Eu acredito na experiência da escrita total. A literatura passa pela música, pelas artes cênicas e artes visuais, mas também pelas tradições populares. Nós acreditamos que a literatura não nasce simplesmente no papel; ela nasce do corpo para o papel. Ela começa com as Taieiras, de Laranjeiras, no canto-poema, em toda a tradição popular. Por isso, me sinto muito honrada de ter a oportunidade de estar aqui neste dia, que não é apenas um dia de descanso, mas um dia de reflexão”, declarou a multiartista e pesquisadora, que iniciou a mesa fazendo uma contação de história.
Em seguida, foi a vez da também multiartista, escritora, poeta, atriz e dramaturga Cristiane Sobral falar sobre o tema “Aquilombamento literário: mulheres negras na literatura, construindo conexões de afeto e ancestralidade”. Na mesa mediada pela Profª Dra. Sara Rogéria Santos Barbosa, a autora das obras “O tapete voador” e “Não vou mais lavar os pratos” reforçou o poder da união entre mulheres pretas para fortalecer suas histórias e aumentar o impacto social e comercial de suas produções, incluindo cantos, performances e poemas a sua apresentação.
Cristiane reforçou a ideia de que as mulheres negras são precursoras do Brasil, são as maiores intelectuais do planeta e devem conhecer a potência de seu valor. “Nós somos a base deste país. Tudo o que existe no Brasil passa, de alguma forma, pelo trabalho das mulheres, especialmente mulheres negras e indígenas, mesmo enfrentando abandono, criando filhos sozinhas, trabalhando em condições difíceis, nada disso diminui a nossa grandeza”, evidenciou a autora.
Além das mesas com autores nacionais e sergipanos, o salão de literatura conta, neste ano, com a presença da Mangue Jornalismo, produção jornalística independente que irá promover rodas de conversas sobre informação, literatura e humanidades ao longo do festival. No primeiro dia de debates, o tema escolhido foi “Jornalismo negro no Brasil”, com a participação dos jornalistas e especialistas Laila Oliveira, Aíla Cardoso, Tatiane Macena e Emerson Esteves, em uma conversa mediada por Wendal Carmo.
Os tópicos e experiências abordados ao longo da tarde impactaram o público, diverso e engajado em perguntas e comentários, que ainda aproveitou para coletar autógrafos das autoras após cada sessão. Deize Maria, por exemplo, já assistiu uma palestra de Elisama Santos na instituição onde trabalha e ficou impressionada com a diversidade que já encontrou nas ruas do festival e no salão de literatura.
“Achei o diálogo muito interessante, principalmente por ser no Dia da Consciência Negra. Essa consciência precisa ser um trabalho diário, que vem desde a educação doméstica. Também não precisamos apenas combater o racismo, mas fazermos ações antirracistas, começando na infância com a família. Participar deste espaço foi muito importante para mim e pretendo vir para mais palestras”, detalhou.
Já a médica Emanuelle Bezerra, que esteve no Fasc pela primeira vez, evidenciou a emoção de estar presente em um debate sobre educação antirracista com seu filho: “Para mim é importante contar para ele as nossas histórias que foram silenciadas, contar a verdade. Trazer meu filho para cá é mostrar qual é nosso verdadeiro lugar”.
Segundo Paola Santana, presidenta da Fundação Municipal de Patrimônio e Cultura João Bebe Água (Fumpac), as atrações deste ano foram planejadas com o objetivo de representar a diversidade e a riqueza cultural que simboliza e é um compromisso prioritário do Fasc. “Abrir o festival no Dia Nacional da Consciência Negra é uma responsabilidade e um ato de resistência, por isso nossa curadoria tem o cuidado de montar uma programação de alta qualidade artística e pluralidade de gêneros, etnias e estilos”, reforçou a gestora, animada pela contribuição das autoras e do público.
O Salão de Literatura Manoel Ferreira continua a programação nos dias 21, 22 e 23 de novembro, a partir das 14h, e ainda receberá grandes nomes como Raphael Montes, o jornalista Chico Sá, o poeta Sérgio Vaz e outros artistas.
Confira a programação:
Sexta-feira (21/11)
14h - Raphael Montes Tema: “À beira do precipício: a criação literária” /Mediação: Profª Dra. Pâmela Sampaio
15h - Sala Mangue Jornalismo - Roda de conversa sobre “Jornalismo, literatura e arte sergipana”
15h30 - Lançamento/Sessão de autógrafos dos autores
16h - Ministra Cármen Lúcia (Vídeo-palestra). Tema: “Desburocratizar a literatura”
Sábado (22/11)
14h - Luiza Romão e Débora Arruda. Tema: “Extra! Extra! Também temos pedras aqui!”/ Mediação: Stella Carvalho
15h - Sala Mangue Jornalismo - Roda de conversa sobre “Jornalismo e memória”
15h30 - Lançamento/Sessão de autógrafos dos autores
16h - Chico Sá e Sérgio Vaz. Tema: Palavra, literatura e ruptura”/ Mediação: Allan Jonnes.
17h - Lançamento/Sessão de autógrafos dos autores
Domingo (23/11)
14h - Izabel Nascimento e Bruxas do Cangaço. Tema: “Literatura de Cordel e Hip Hop”/ Mediação: Ísis da Penha
15h - Sala Mangue Jornalismo - Roda de conversa sobre “Jornalismo, literatura e palestina”
15h30 - Lançamento/Sessão de autógrafos dos autores
16h - Roda Fasc de Poesia com Pedro Bomba, Débora Arruda, Bruxas do Cangaço, Izabel Nascimento, Bell Puá, Gustavo Aragão, Luiza Romão, Allan Jonnes e Stella Carvalho
Sobre o Fasc
Com o tema “Na cultura a gente se encontra”, a 40ª edição do Fasc contará com 11 espaços multiculturais que proporcionarão uma experiência completa e imersiva em diversas linguagens artísticas, como música, teatro, dança, literatura, artes visuais, cinema e outras, em uma grande celebração da riqueza cultural de São Cristóvão, a quarta cidade mais antiga do Brasil.
O Festival de Artes de São Cristóvão é apresentado pelo Ministério da Cultura, com realização da Prefeitura de São Cristóvão, por intermédio da Fundação Municipal do Patrimônio e da Cultura João Bebe Água (Fumpac) e do Encontro Sancristovense de Cultura Popular e Outras Artes (ESCOA); Governo do Estado de Sergipe, através da Fundação de Cultura e Arte Aperipê (Funcap) e Governo do Brasil. O Festival conta ainda com patrocínio da CELI, Banco do Nordeste, Iguá Sergipe, Ecoparque Sergipe e CAIXA. O apoio fica por conta da SE – Sistema Engenharia, Colortex Tintas, Unir Locações e Serviços e Vitória Transportes.
Fotos: Clara Dias
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